segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

2010

Bom, o ano começou e eu já estou atrasada!
É que amanhã sairá minha terceira coluna no site Culturaria e eu nem publiquei a segunda (de dezembro de 2009).
Mas tudo bem. Vamos começar o ano recapitulando!

Para imaginar uma história, apague as luzes.
Por Júlia Novaes


O Club Noir, com um nome desses e uma peça com esse título, não deixa dúvidas que trabalha diretamente e sempre com a escuridão (e, por conseqüência, com a luz).

Para quem foi despreparado ao Sesc Pompéia, não adiantou ler as sinopses de divulgação para tentar entender a peça. Isso porque o texto de Gregory Motton já é um texto difícil e completamente entrecortado, sem linearidade de tempo. E a montagem do diretor da companhia de teatro Club Noir, Roberto Alvim, picotou ainda mais o texto deixando pouco da história do marinheiro irlandês Tom Doheny e muito da reflexão lírica do dramaturgo.

É preciso entrar no teatro com outros olhos. Ao sentar-se no galpão do Sesc a vista começa, aos poucos a se acostumar com a escuridão e logo, tudo o que a delicada luz pontua no palco salta aos olhos. O texto e a voz, principal ponto do estudo do Club Noir é trabalhado na peça de uma forma muito específica: os três atores, ao invés de dividirem entre si os personagens, transitam entre eles: às vezes, sozinho no palco, o mesmo ator faz um diálogo todo.

É como se não houvesse diferença entre diálogo e monólogo. E, como em cena, quase não há movimentação, as vozes dos atores são trabalhadas como música e, elas sim, se movimentam: do grave para o agudo, do lento para o rápido, do sólido para o airado. E é nessa brincadeira que está a beleza da peça.

Sem necessidade de entender a história racionalmente, é preciso sentir, experiênciar, ouvir. Isto porque toda a dificuldade das elipses de tempo, dos recortes da história e da multiplicidade dos personagens é facilitada pela visualidade. O cenário tem apenas dois bancos e alguns símbolos: a árvore, a maçã, a cobra e o porco. São símbolos simples, até clichês, presentes do imaginário de todos, mas utilizados de forma muito plástica que acrescenta um véu de familiaridade a aridez da peça.



E a falta de movimentação dos atores, os símbolos, a luz pontuada e a musicalidade da voz dão espaço para a imaginação. A poesia do texto deixa o espectador (que deve ir ao teatro com a mente aberta) entender a batalha entre Tom, Deus e o Demônio de diferentes formas. E deixar espaço aberto para outro tipo de entendimento do público, que não é o entendimento racional, e para a imaginação é uma raridade numa arte visual como é o teatro hoje. Estamos acostumados a ver peças (filmes, exposições etc) em que não precisamos sentir nem imaginar, pois tudo nos é dado de forma quase didática: quem é o protagonista, para onde vai, o que quer, quem está dificultando a vida dele e assim por diante.

Ao contrário do que se pensa, acredito que uma montagem aberta e experimental neste sentido, de trazer ao espectador uma experiência diferente não é subestimar a inteligência do público, como muitos pensam ou se sentem ao sair da peça sem entendê-la racionalmente. Para mim, um desafio desse tipo na verdade leva em conta a inteligência do público, propondo que o sentido do que foi experimentado ao assistir a peça possa ser criado pelo próprio espectador.

A temporada foi curta (acabou neste domingo, dia 13 de dezembro) e eu ouvi pouco sobre o que as pessoas acharam da peça. É uma pena, porque uma peça difícil dessa, na minha opinião, deveria ter sido mais discutida. Se alguém a viu, gostaria de saber se o embate entre Deus e o Demônio estabelecido no palco foi também o embate entre os seus Deuses e os seus Demônios internos.

Pra quem quiser seguir o site-blog: Culturaria

Também recomendo dar uma olhada nos outros colunistas que eu também tenho seguido e lido - mesmo que pessoalmente, só tenha conhecido uma, a ; na nossa cervejada de fim do ano.

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